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sexta-feira, 27 de abril de 2012

Os prejuízos do PL do Ato Médico para a saúde brasileira


O Conselho Federal de Psicologia (CFP) considera que a proposição que trata do Ato Médico – SCD 268/2002, nos termos em que se encontra até o presente momento, priva as profissões da saúde do livre exercício de suas atividades.
Art. 4º São atividades privativas do médico:

Cabe destacar que a discussão acerca desse assunto se iniciou em 2002, quando dois projetos de lei começaram a tramitar no Senado Federal: o PLS nº 25/2002, de autoria do então senador Geraldo Althoff (PFL-SC), e o PLS nº 268/2002, do ex-senador Benício Sampaio (PFL/PI). Desde então, a proposta de regulamentação da Medicina tem sido alvo constante de manifestações e protestos de várias entidades relacionadas à saúde, Conselhos Profissionais e inclusive médicos de renome, haja vista que a proposição possui vários equívocos que prejudicam o caráter de integralidade que o cuidado à saúde deve respeitar. Essa discordância indica que a matéria deve ser tratada com o maior zelo possível, garantindo que sejam ouvidas todas as partes interessadas.

O CFP não é contra a regulamentação da Medicina, tal regulamentação é direito e dever de todas as profissões. No entanto, essa legislação deve ser elaborada de forma responsável, respeitando o princípio de integralidade do SUS e os importantes papéis das outras profissões no contexto da saúde. O atual formato da proposição resulta em uma hierarquia profissional que é maléfico para o Sistema Único de Saúde, criando atropelos, dificuldades de acesso e comprometimento e prejuízo do projeto multiprofissional de atenção e promoção da saúde.

Além disso, outro pólo preocupante é a origem corporativista que configura a discussão, sendo a voz proeminente aquela que caminha na contramão dos avanços feitos no cuidado com a saúde e na negação da possibilidade de formação de equipes multiprofissionais, com profissionais devidamente competentes para exercer suas atividades, competência essa garantida desde a promulgação da nova LDB.

Os múltiplos olhares profissionais que conferem um caráter ampliado e qualificado no lidar com a saúde da população brasileira não podem sucumbir à interesses corporativistas e de reserva de mercado expressos no atual formato do PL.

O artigo 4º do PL prevê que a formulação do diagnóstico nosológico e respectiva prescrição terapêutica são atividades privativas dos médicos. Ainda que nos artigos posteriores, o texto tente assegurar o diagnóstico produzido por outras profissões, a mensagem se torna ambígua, pois vincula qualquer diagnóstico nosológico à indicação médica:
I – formulação do diagnóstico nosológico e respectiva prescrição terapêutica;
(...)
§ 1º Diagnóstico nosológico privativo do médico, para os efeitos desta Lei, restringe-se à determinação da doença que acomete o ser humano, aqui definida como interrupção, cessação ou distúrbio da função do corpo, sistema ou órgão, caracterizada por no mínimo 2 (dois) dos seguintes critérios:
I – agente etiológico reconhecido;
II – grupo identificável de sinais ou sintomas;
III – alterações anatômicas ou psicopatológicas.
§ 2º Não são privativos do médico os diagnósticos funcional, cinésio-funcional, psicológico, nutricional e ambiental, e as avaliações comportamental e das capacidades mental, sensorial e perceptocognitiva.

Realizar diagnóstico nosológico significa diagnosticar doenças e indicar as terapêuticas. Todos os profissionais da saúde realizam diagnóstico nosológico, ou seja, diagnóstico de sinais e sintomas das doenças. Cada profissional da saúde também efetua a respectiva prescrição terapêutica em sua área de formação e experiência. O Estado não pode admitir que sejam feitas prescrições terapêuticas em áreas nas quais não o profissional não possui habilidade específica. Psicólogos não farão prescrições terapêuticas médicas assim como médicos não farão prescrições terapêuticas psicológicas.

O diagnóstico nosológico como atribuição privativa do médico implica na impossibilidade de contribuição de qualquer profissão para a promoção da saúde. É preciso ressaltar que a saúde é produto de ação coletiva multiprofissional, transdisciplinar e que o SUS já reconheceu em todos seus programas e ações. O PL do Ato Médico vem atropelar práticas já consagradas pelo Ministério da Saúde através dos princípios do SUS.

Além disso, a aprovação do Projeto do Ato Médico levará a uma burocratização das rotinas e os usuários dos serviços de saúde teriam seu direito de escolha extinto, já que o médico seria o responsável pela avaliação de suas necessidades de assistência à saúde. O projeto impõe um autoritarismo nas relações de trabalho, o que implica que, mesmo em uma equipe formada por vários profissionais, a palavra final em qualquer decisão será dada pelo médico, não sendo, portanto, uma decisão compartilhada e co-responsabilizada.

Hoje as demandas sociais exigem uma nova clínica inserida na comunidade, que procure abraçar outras variáveis determinantes do processo saúde-doença que não apenas biológicas e individualizantes, mas insiram a medicina como prática social, o médico como trabalhador da saúde, junto aos outros profissionais, e a saúde como um dos meios de promoção da autonomia e protagonismo da sociedade.

CFP

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